Por: David Guimarães
1.
Venho tecendo algumas críticas a
Julen Lopetegui nesta última semana. A saída de bola na primeira zona de
construção era excessivamente lenta e completamente infrutífera. Os laterais
ficavam presos atrás procurando oferecer linha de passe aos centrais, não se
projectando ofensivamente. Quando a bola ia parar ao médio defensivo
(Casemiro), este recebia-a de costas e não conseguia (ou não procurava) rodar e
virar-se de frente para o jogo. Dito isto, o pivot não estabelecia a ligação necessária entre o sector defensivo
e os outros sectores por não ser capaz de transportar em condução nem de
efectuar um passe vertical. A solução era sempre o recuo, parecendo o central
Maicon o “jogador chave” do Porto na organização em posse, tal eram as vezes que
era solicitado para iniciar a construção, qual “número 10”. Julgo que o treinador
do Porto percebeu essas lacunas, não denotando inflexibilidade nas suas ideias,
retrocedendo, nos últimos jogos, no modelo para a primeira fase de construção.
O espanhol demonstrou algo raro na natureza humana, a humildade de reconhecer
um erro e de o rectificar. Analisando a percentagem de posse de bola,
percebemos esta inflexão no modelo, visto que grande parte do tempo em que o
Porto tinha o esférico em sua pose era ainda no seu meio campo, zona de pouca
pressão dos adversários, o que possibilitava uma fácil conservação da
“redondinha”. Nos últimos quatro encontros disputados, Arouca e Nacional
para o campeonato e os dois jogos frente ao Athletic Bilbao para a Liga dos
Campeões, as estatísticas relativas à posse de bola da equipa
portista desceram consideravelmente. De uma média de quase 70% nos nove encontros
anteriores, houve uma quebra para aproximadamente 57% nos quatro jogos referidos. As perdas de bola no seu
meio-campo diminuíram consideravelmente, em resultado da diminuição do número
de troca de passes em zonas recuadas. O número total de passes do Porto
diminui também bastante. Não incluindo aqui o jogo no País Basco, nos outros
três encontros referidos, as ligações entre jogadores caíram de 590 para
452, queda de quase um quarto. Existiu uma quebra de número, mas não de eficácia,
que continua na casa dos 85%, a mais certeira do campeonato nacional. Este
estilo menos apoiado e um pouco mais vertical e rápido na saída de bola é
crucial para o Porto explanar todas as suas aptidões futebolísticas. Lopetequi
mostrou não ser agarrado a sistemas, soube com humildade e inteligência,
rectificar o que estava mal.
2.
“Ao nível do futebol sénior este
fim-de-semana jamais poderá ser esquecido. Quer a equipa principal quer a
equipa B brindaram os sportinguistas com péssimas exibições que não dignificaram
o nosso Clube e a nossa camisola. Não demonstraram garra nem vontade de vencer
e isso é lamentável só nos restando pedir desculpa por não termos sido dignos
do Clube que representamos.”. Estas foram as declarações do Presidente do
Sporting, Bruno de Carvalho, no final de um fim-de-semana desastroso para as
suas equipas seniores. O plantel principal perdeu por 3-0 em Guimarães contra o
Vitória local e a equipa B foi esmagada na Tapadinha, frente ao Atlético, por
5-0. Na transcrição supracitada fica explícito que o presidente leonino
apelidou os seus jogadores de indignos por não terem, na sua opinião,
demonstrado garra nem vontade de vencer. Apesar de Bruno de Carvalho se incluir
nesta desanca ao afirmar: “não termos sido dignos do clube que representamos”,
não está apenas a falar em nome próprio, mas a tecer considerações destrutivas
também sobre outros dois grupos de trabalho extensos e numerosos, questionando
vigorosamente a sua índole sem qualquer prova consubstancial. Este presidente
tem empreendido uma forma de comunicar desprezível, utilizando até, por vezes,
uma imagética escatológica. Essa deselegância e imponderação, anteriormente
para “fora de portas”, já se alastraram ao “refúgio mais confortável” do leão,
o balneário. Nani, por exemplo, deve ter ficado extasiado com estas palavras
“laudatórias” do seu presidente, pois acabou o jogo junto do seu fisioterapeuta
em esgar de sofrimento. Onde se situou Marco Silva no decorrer da semana? Se
adoptasse uma retórica mas dura, iria ser conotado com a opinião presidencial,
se tentasse uma abordagem mais benevolente, estaria desconexo com o estado de
espírito flamejante do líder. Terá sido extremamente difícil para o treinador
encontrar espaço para uma mensagem independente e para dar a sua opinião livre,
tal eram as amarras condicionantes. Quando nos agridem, a resposta é
localizada, repentina e temerária, para assim se proceder a um restauro da
honra, como se viu no jogo supérfluo contra o Schalke 04. Depois da reacção
pronta, o agredido é atormentado com o ressentimento, a descrença e o desapego.
A relação afectiva dos jogadores para com o seu presidente sofreu, com certeza,
um forte abalo. Juntando linguagem obscena a visões redutoras e provocatórias
da história e do discurso dos seus rivais (vejam as minhas nótulas duas semanas
atrás), Bruno de Carvalho demonstra ser também um agente instigador na
tentativa de estilhaçamento de fronteiras entre público/privado, que grassa na
nossa sociedade estupidificada e estupidificante. Este escancarar de considerandos
para a praça pública, qual reality show, é
pernicioso. Julgo que a equipa de Futebol do Sporting Clube de Portugal vai
“pagar caro” estas declarações de Bruno de Carvalho. Esta atitude impensada
direi melhor, ponderada até à exaustão pelo seu presidente, vai trazer efeitos
nefastos a longo prazo certamente. A equipa vai baquear e o espirito de grupo
salutar vai-se esbater.